Autora: Katiany Novais
Pela necessidade de sobrevivência, desde o início da humanidade, várias formas de gerar energia surgiram: força humana, fogo, tração animal, quedas d’água, carvão, petróleo, urânio etc. Chegou um momento em que os combustíveis fósseis se tornaram a principal fonte de geração de energia e, com o passar do tempo, isso resultou em uma crise energética.
Acidentes nucleares como o da Usina de Chernobyl. A enorme emissão de gases poluentes que intensificam o efeito estufa e resulta no aquecimento global. O desequilíbrio entre consumo e disponibilidade de recursos naturais. Estes são alguns fatores que tornaram necessárias novas formas de produzir energia. E é nesse cenário que entram as energias renováveis.
Energias renováveis são aquelas ditas inesgotáveis, são provenientes de recursos naturalmente reabastecidos. Estão no ambiente de forma ilimitada e podem ser geradas por elementos naturais a qualquer momento, e no mar não seria diferente. Nesse contexto, quais são as principais energias renováveis no mar?
Energia eólica offshore
Energia renovável das ondas
A formação das ondas corresponde a um fenômeno de interação oceano-atmosfera pela força do vento sobre as águas. O seu tamanho depende da velocidade do vento, da sua duração e da sua distância em relação à água, e isso afeta diretamente a capacidade de geração de energia. Geralmente, o estado do mar com maior ondulação apresenta maior conteúdo energético.
O seu movimento de vai e vem e de cima para baixo consegue gerar energia cinética que é aproveitada por aparelhos e transformada em elétrica. Existem dois tipos de locais para a captação de energia: na área de fetch, definido como o comprimento ao longo do qual o vento sopra sem obstáculos, e no swell. No fetch, as ondas possuem maior amplitude, porém elas são mais irregulares e o mar é bem mais agitado. No swell, é onde a onda tem o aspecto de onda na praia, com direção e período mais bem definidos.
Existem três principais formas de conversores usados na geração de energia das ondas: coluna d’água oscilante (oscillating water column – OWC), corpos oscilantes e dispositivos de galgamento.
No método OWC, a oscilação da coluna d`água gerada pelas ondas estimula a descida e subida de ar, o que movimenta a turbina. Pode ser fixa na costa ou flutuante.
No segundo método, são utilizados corpos que oscilam por causa das ondas. Podem ser submersos ou flutuantes.
Por último, nos dispositivos de galgamento, a água proveniente da onda entra em um reservatório, uma espécie de piscina, e gira uma turbina, convertendo a energia potencial em eletricidade.
Energia renovável das marés
As marés são geradas pela força gravitacional do Sol e da Lua em relação à Terra, e, como é um movimento cíclico, esse tipo de geração de energia é mais previsível e constante, e também pode ser chamada de energia maremotriz.
O mecanismo é semelhante ao de uma usina hidrelétrica. As usinas de barragem usam a diferença de altura entre a água de um lado e do outro da barragem, separadas por uma comporta, durante as marés para acionar hidroturbinas. O mecanismo pode ser realizado de três formas dependendo da orientação da turbina: por “inundação”, por “vazamento” e pelos dois jeitos combinados.
Por inundação, a água entra na bacia além da barragem da seguinte forma: com a maré baixa, fecha-se a comporta até que a maré suba até o nível máximo. Quando isso ocorre, ela é aberta, a água passa e gira a turbina para gerar energia.
Já com o vazamento, a água sai do reservatório da barragem. Quando o nível dos dois lados se igualam no ponto máximo, a comporta é fechada até que a maré chegue no ponto mínimo e então ela é aberta, a água passa e gira a turbina.
Combinando as duas formas anteriores, transforma-se a energia das marés em elétrica durante a maré cheia e baixa utilizando uma turbina bidirecional, geralmente mais cara e menos eficiente.
Energia renovável das correntes
As correntes são geradas por elementos atuando na água, como por exemplo, o vento, a diferença de temperatura e de salinidade. A grande vantagem no seu uso para a geração de energia é a sua constância. A velocidade é estável e a direção é fixa, o que possibilita uma captação de energia por 24h. Apesar de serem lentas, a água é mais de 800 vezes mais densa do que o ar, o que não impede um grande potencial energético.
Basicamente, em todas as formas de geração de energia, a energia cinética das correntes é transformada em mecânica e esta, por sua vez, é transformada em eletricidade. No entanto, existe diferença entre as correntes oceânicas e correntes das marés. A primeira é unidirecional e a segunda é bidirecional, o que implica diretamente no design da turbina, explicado a seguir.
Existem quatro formas principais: com eixo vertical, com eixo horizontal, com hidrofólios oscilatórios e outro utilizando o Efeito Venturi.
No modelo de eixo vertical, o aparelho flutuante submerso possui uma haste e, conectada à ela de forma paralela, há outras duas que giram conforme a passagem da corrente marítima, gerando energia mecânica. Tal estrutura é flutuante, o que confere uma desvantagem por causa da instabilidade, porém a grande vantagem é que as hastes giram nos dois sentidos.
Já no eixo horizontal, uma haste é fixa no leito oceânico e, presa à ela, há uma espécie de hélice que gira conforme o curso da corrente, resultando em energia mecânica. Sua desvantagem é que as pás giram em um único sentido, e a vantagem é a estabilidade por ser fixa.
No esquema de hidrofólios oscilatórios, o hidrofólio é preso em uma espécie de braço de alavanca. A água passa por ele e o empurra para cima. Esse movimento oscilatório de sobe e desce gera energia.
Por fim, utilizando o Efeito Venturi. A sua vantagem é que pode ser utilizado em locais onde a velocidade da corrente for menor, exatamente pelo seu princípio de funcionamento. Como a velocidade da corrente é estável, a quantidade de líquido que flui por unidade de tempo deve ser a mesma para as duas regiões do tubo. Logo, onde o tubo for mais estreito, a velocidade da água se torna maior, as pás são giradas e, consequentemente, a turbina também.
Energia térmica oceânica
A conversão da energia térmica dos oceanos (OTEC) utiliza a diferença de temperatura entre a água da superfície e de áreas profundas. A diferença deve ser de, no mínimo, 20ºC para obter potencial energético suficiente. A sua grande vantagem é que a geração de energia pode ocorrer por 24h, uma vez que existe diferença de temperatura a todo momento. Para a geração, existem três formas: ciclo fechado, aberto ou híbrido.
O mecanismo de ciclo fechado produz energia por meio do ciclo de Rankine, no qual utiliza-se um fluido de trabalho com baixa temperatura de ebulição. A água quente da superfície vai para o trocador de calor aumentando a temperatura do fluido de trabalho, que muda para o estado de vapor. Em seguida, o fluido vaporizado aciona uma turbina, vai para o condensador, onde troca calor com a água fria e torna-se líquido. Por fim, ele é bombeado novamente para o evaporador e o ciclo reinicia.
No esquema de ciclo aberto, utiliza-se a própria água da superfície como fluido de trabalho. Ela é colocada em um recipiente à vácuo, no qual a baixa pressão a transforma em vapor. Este aciona a turbina e depois passa pelo condensador, onde é condensado pela água fria. A vantagem desse esquema é a produção de água dessalinizada, uma vez que o sal permanece na câmara à vácuo e, consequentemente, ao sair do condensador, a água sai sem essa substância.
Por último, há o ciclo híbrido, uma combinação do ciclo fechado com o aberto. Nele, a água da superfície é transformada em vapor na câmara à vácuo. Este é usado para vaporizar o fluido de trabalho escolhido de um ciclo fechado que, em estado de vapor, aciona a turbina para produzir eletricidade. O vapor é condensado no trocador de calor, produzindo água dessalinizada.
Energia renovável resultante do gradiente de salinidade
A diferença de entropia entre a água doce e salgada pode ser usada para produzir energia. Para isso, existem dois métodos e ambos utilizam dois reservatórios separados por uma membrana semipermeável: osmose a pressão retardada (pressure retarded osmosis – PRO) e eletrodiálise reversa (reverse electro-dialysis – RED).
No método PRO, por causa da pressão osmótica, há o transporte de água doce através da membrana para o reservatório de água salgada. Esse fluxo aciona uma turbina e produz eletricidade.
Já no esquema RED, há o transporte de íons. A água salgada e a doce passam por uma série de membranas específicas e a diferença no potencial químico entre as membranas resultam em uma corrente de baixa voltagem. Depois disso, a água salobra é descartada no oceano.
- Energia eólica offshore
É uma energia limpa na qual os ventos movimentam as lâminas dos aerogeradores, captando energia cinética, que é transformada em mecânica e em seguida em elétrica. Esta, por sua vez, é transmitida até a costa por cabos submarinos. Em relação às instalações, elas podem ser fixas ou flutuantes dependendo da profundidade.
Quando se trata de offshore, é inevitável a comparação em relação à eólica onshore. E, em relação à energia eólica em terra, há muitas vantagens. No mar, os ventos não possuem obstáculos construídos pelos homens ou até mesmo naturais, o que possibilita um vento mais uniforme e veloz. Pela mesma razão, o fluxo no ar do oceano é menos turbulento. Esses fatores garantem uma constância na produção.
Além disso, não é necessária uma preocupação tão grande com a poluição sonora e visual por causa da distância até a costa.
Por fim, a questão logística interfere diretamente na produção. Para o transporte das estruturas até o mar, costumam ser usados navios e barcas e, como não há túneis e ruas que limitam o tamanho dos componentes, as turbinas offshore são maiores e captam mais energia.
Conclusão
Com todas as formas renováveis de geração de energia no oceano apresentadas acima, percebe-se que não faltam opções para uma produção mais limpa e sustentável. Tal cenário se apresenta cada vez mais urgente diante da crise energética em vigor, resultado de anos utilizando energia de combustíveis fósseis poluentes e esgotáveis.
Portanto, a energia das ondas, das marés, das correntes, do gradiente térmico, do gradiente de salinidade e a eólica offshore são caminhos para serem seguidos e estudados a fim de cessar acidentes nucleares, reduzir a emissão de gases poluentes e preservar o meio ambiente.
Referências
“Ocean Renewable Energy Potential, Technology, and Deployments: A Case Study of Brazil”, Milad Shadman, Corbiniano Silva, Daiane Faller, Zhijia Wu, Luiz Paulo de Freitas Assad, Luiz Landau, Carlos Levi e Segen F. Estefen, disponível em https://www.mdpi.com/1996-1073/12/19/3658/htm
“Energia renovável do oceano”, Milad Shadman, em material disponibilizado pelo professor
“Análise de não-linearidades na predição do comportamento hidrodinâmico de um conversor de energia das ondas”, Evandro Ferreira de Paula Filho, disponível em http://www.monografias.poli.ufrj.br/monografias/monopoli10030510.pdf
“Estudo da viabilidade de implantação de plantas para conversão de energia térmica do ocenao (OTEC) no Brasil”, Marcus Godolphim de Castro Alves, disponível em https://www.feis.unesp.br/Home/departamentos/engenhariamecanica/nuplen/000836695.pdf